Após ocupação da reitoria, estudantes da Ufrgs elaboram as pautas definitivas de reivindicações
Estudantes de diversos cursos de graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul ocuparam, na manhã desta quarta-feira (14), a Reitoria da instituição. O movimento teve início às 9h e não possui ligação com a ocupação da diretoria da Faculdade de Direito, iniciada no dia 5 de maio. Alunos de vários diretórios acadêmicos, coletivos, e de iniciativa independente compõem o movimento de ocupação.
Conforme nota publicada em uma página do Facebook chamada Ocupa Reitoria – UFRGS, o fato desencadeante da ação foi a invasão da polícia militar na Escola de Educação Física (ESEF). Além disso, eles criticam a universidade por não atender diversas reivindicações relacionadas à Casa do Estudante, RU, assistência estudantil, paridade, segurança, infra-estrutura – questões já há tempos reivindicadas na universidade – entre outras. Está marcada para as 20h uma assembleia geral para refinar as proposições da pauta.
Por volta das 10h, o gabinete de segurança da universidade determinou que o prédio fosse trancado, e alunos e funcionários ficaram sem acesso para entrar ou sair das dependências da reitoria. O fato gerou indignação por parte dos estudantes. “A reitoria não se posiciona, não abre diálogo. A gente entrou aqui pacificamente, num ato completamente dentro das leis, e a reitoria inconstitucionalmente orientou para fecharem as portas”, conta Queops Damasceno, estudante de Geografia.
Cerca de 60 pessoas da ocupação estavam dentro do prédio no momento. “Isso exemplifica a falta de diálogo da universidade. Em vez de virem aqui saber das nossas reivindicações, mandaram trancar as portas”, expõe um dos alunos, estudante de Ciências Sociais. A entrada foi liberada ainda no período da manhã. Um representante da reitoria foi ao encontro dos estudantes e informou que o vice-reitor, Rui Vicente Oppermann, se disponibilizaria para conversar e tomar conhecimento das pautas.
Após isso, o grupo reuniria uma comissão de quatro representantes para uma conversa preliminar. No entanto, as pautas definitivas a serem apresentadas ao reitor serão decididas somente na assembleia. Os alunos afirmam que não ocorrerá desocupação até que as reivindicações sejam atendidas. “Podemos ficar aqui um mês ou um ano. Por que a gente não tem dúvidas que se a gente sair daqui, irão virar as costas para o movimento e não vão atender às reivindicações. A obra, o restaurante, a paridade, vão demorar? Não tem problema, nós aguardamos aqui”, afirmou Damasceno.
Confira na íntegra a nota divulgada pelos estudantes:
“REITORIA DA UFRGS OCUPADA!
Nós, estudantes dos mais diversos cursos de graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, cansados de tentar buscar soluções para a enorme quantidade de problemas – através de reuniões com institutos, pró-reitoria e reitoria – enfrentados continuamente por milhares de alunos, ano após ano, ocupamos nesta manhã, dia 14 de maio de 2014, a reitoria desta instituição.
No mesmo ano em que direitos como moradia, saúde e educação foram deixados de lado pelos governantes para investir bilhões de reais em estádios para a realização da Copa do Mundo da FIFA, a UFRGS comemora seu 80º aniversário com a falsa propaganda de “80 anos de excelência”. Excelência cujos estudantes, em sua grande maioria, não veem pelos corredores, campi ou salas de aula que frequentam!
Os nossos direitos estudantis são atacados constantemente! As vagas na Casa do Estudante não correspondem às necessidades de moradia dos alunos da UFRGS. Inúmeras queixas, reclamações e protocolos foram completamente ignorados durante anos pela reitoria universitária, chegando ao agravante de, em uma reunião realizada neste ano, o Pró-Reitor de Assuntos Estudantis recomendar que os próprios moradores da casa de estudantes procurassem edifícios para uma nova casa!
A qualidade do RU vem diminuindo progressivamente. No Campus do Vale o desaparecimento da guarnição e em todos os campi feijão dia-sim-dia-não! O RU da Faculdade de Agronomia, que atende aos estudantes moradores da CEFAV, funciona apenas no horário do almoço, tornando necessário o deslocamento destes alunos a outro restaurante para jantar. Àqueles que não comem carne, muitas vezes resta apenas comer arroz branco e chicória.
O valor pago pelas bolsas – pouco mais da metade de um salário mínimo – é insuficiente para os estudantes que necessitam de auxílio para se manterem na universidade. É evidente que as cotas não podem garantir por si só a presença de estudantes de baixa renda na universidade, tão pouco que tais ingressantes cheguem a concluir o curso. Fazem-se necessários programas de assistência estudantil que contemplem as necessidades de seus alunos cotistas e de baixa renda. O formato atual de assistência estudantil oferecido pela UFRGS é ineficiente, não cumprindo seu papel de auxiliar a formação do estudante carente e sua inclusão social na universidade. Além disso, o método de ingresso atual da universidade promove o racismo institucional ao ordenar os ingressantes nas matrículas por sua colocação no vestibular, segregando os alunos cotistas dos não cotistas nos cursos em que ocorre ingresso no primeiro e no segundo semestres.
A infra-estrutura da universidade vai de mal a pior! No Campus do Vale, por exemplo, a biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas está fechada há meses devido ao rompimento de um cano que inundou o recinto e estragou grande parte do acervo, tendo sua previsão de retorno “talvez” em 2015 ! De toda maneira a biblioteca encontra-se em local inadequado – dentro de um prédio de sala de aula – e mesmo existindo um projeto de biblioteca central no Campus do Vale desde 2010, sua construção “talvez” iniciará em 2016! Diversos cursos não possuem bibliotecas e salas de informática capazes de atender às demandas dos alunos e exigências dos professores, seja pelo acervo, infraestrutura ou horários. Os banheiros, em estado de calamidade, apresentam-se constantemente entupidos e sem papel higiênico. Sem explicações – ao estilo da gestão atual –, sumiram telefones públicos dos campi, e agora, como a cereja no bolo do desmonte da universidade, somem também os bebedouros. A falta de professores é também um fato que chama a atenção, juntamente com a radical enxugada de créditos dos currículos, levando a acreditar que muitos cursos de graduação, em breve, terão o status de curso técnico. Disciplinas que antes eram abertas a todos os cursos como eletivas [a exemplo, as linguas intrumentais] foram simplesmente retiradas. Além disso, temos casos de alunos que não conseguem concluir o curso por não conseguirem matrícula em disciplinas finais (como as de estágio obrigatório nas licenciaturas) por falta de professores.
Mesmo depois de 80 anos de existência, ainda temos uma universidade que não oferece acessibilidade a pessoas com necessidades especiais. Cadeirantes, por exemplo, praticamente não conseguem se deslocar dentro do Campus do Vale!
SÃO 80 ANOS DE DESCASO E FALTA DE RESPEITO COM OS ESTUDANTES!
Não bastasse tais incidentes, a comunidade acadêmica ainda sofre com falta de segurança, chegando ao absurdo da ocorrência frequente de casos de estupro e assalto nos campi. Isso é consequência da não abertura de concursos públicos para seguranças universitários há mais de dez anos e, também, de uma política falida de segurança do Estado, que preza pela ação truculenta de policias ao invés de investimento eficaz em segurança. O que temos hoje é uma segurança patrimonial terceirizada e constante presença da Brigada Militar dentro dos campi, que se utiliza da segurança de estudantes como desculpa para intimidar e reprimir atividades culturais/políticas. Na noite do dia 19 de abril de 2014 ocorreu lamentável invasão de 12 brigadianos à universidade, os quais pularam os muros da ESEF (campus Ed. Física) durante um congresso discente de enfermagem, após terem recebido reclamações de barulho por parte de moradores. Frente à negativa de alguns estudantes e do próprio segurança patrimonial de serem autorizados a entrar no local, após todos os aparelhos de som terem sido desligados, a Brigada Militar interrompeu o encontro, agrediu e prendeu 4 estudantes, bem como o próprio segurança terceirizado da UFRGS.
Após a invasão da polícia militar à ESEF, a reitoria não foi capaz de tomar a posição de repúdio que lhe cabia ao lançar uma nota sobre o ocorrido, deixando claro que não tinha intenção de abalar sua “boa relação” para com o governo do Estado. Neste contexto – de reitoria que compactua com repressão aos estudantes–, não podemos deixar de lembrar que essa é a mesma universidade que, bem como outras do estado, possui um infame acordo militar com a empresa de segurança Israelense Elbit [cujo nome no Brasil é AEL] para a produção de um satélite militar. Não queremos que a nossa universidade seja utilizada para produção de conhecimento a estes mercadores da morte, que lucram milhões com o apartheid israelense e promovem o genocídio do povo palestino! Tempos sinistros se aproximam, e fatos como esses são decisivos para sabermos quem é quem e para quem serve a produção de conhecimento acadêmico.
A invasão na ESEF foi a gota d’água! Basta de repressão aos estudantes! Queremos autonomia universitária, queremos a garantia de nossos direitos estudantis, queremos infraestrutura com igual qualidade em todos os campi, e queremos, principalmente, a SAÍDA IMEDIATA DE TODA BRIGADA DOS CAMPI UNIVERSITÁRIOS!
Convidamos toda comunidade para se somar a nós na luta por uma universidade pública e popular, que atenda às demandas da sociedade, cumprindo, assim, sua função social!
UFRGS 8 OU 80? A EXCELÊNCIA NÃO PASSOU POR AQUI!
SEGURANÇA SIM, BM NÃO, POLÍCIA NÃO COMBINA COM EDUCAÇÃO!
DA COPA EU ABRO MÃO, EU QUERO É DINHEIRO PRA MORADIA, ENSINO E BANDEJÃO!”
SUL 21