Nov 29, 2024

Intelectuais repudiam o ódio de classe incentivado pela mídia

Em entrevista recente ao jornal Folha de São Paulo para divulgar o seu novo livro “A construção política do Brasil”, o economista Luis Carlos Bresser Pereira, ex-ministro de FHC, criticou duramente o golpismo movido pelo ódio de classes. Citamos aqui alguns trechos que foram repercutidos por vários intelectuais, inclusive pelo escritor Luís Fernando Veríssimo, em artigo dia 8 no jornal O Globo.

Diz Bresser:

“Um fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o espírito golpista dos ricos contra os pobres. Surgiu um fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe alta, dos ricos, a um partido e a um presidente. Não é preocupação ou medo. É ódio. Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou. Continuou defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Nos dois últimos anos da Dilma, a luta de classes voltou com força. A divisão que ocorreu nos dois últimos anos foi violenta. Quando os liberais e os ricos perderam a eleição não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em punho. E de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo”.

Ao comentar as considerações feitas pelo economista, Veríssimo destacou: “Confesso que até eu, que, como o Antônio Prata, sou meio intelectual, meio de esquerda, me senti, lendo o que ele disse sobre a luta de classes mal abafada que se trava no Brasil e o ódio ao PT que impele o golpismo, um pouco como se visse meu avô dançando seminu no meio do salão — um misto de choque e de terna admiração. Às vezes, as melhores definições de onde nós estamos e do que está nos acontecendo vem de onde menos se espera”.

Panelaço de barriga cheia de raiva

O teólogo Leonardo Boff fez questão de nomear os setores golpistas, que semeiam o ódio de classe no país. Em entrevista nesta última semana à Rádio Brasil Atual ele declarou que a crise econômica e política que o país atravessa é "em grande parte forjada, mentirosa e induzida”, ao ser amplificada por uma “dramatização da mídia conservadora, golpista, que nunca respeitou um governo popular. Devemos dizer os nomes: é o jornal O Globo, a TV Globo, a Folha de S. Paulo, o Estadão, a perversa e mentirosa revista Veja", declarou.

Um destes exemplos foi a tentativa da mídia de transformar em um grande protesto nacional o “panelaço” que as elites promoveram em alguns dos bairros mais ricos do país. Para Boff, o protesto foi "totalmente desmoralizado", pois foi "feito por aqueles que têm as panelas cheias e são contra um governo que faz políticas para encher as panelas vazias do povo pobre".

Em seu blog, o jornalista esportivo Juca Kfouri ironizou o “panelaço nas varandas gourmet”, que para ele não teve nada a ver com protesto contra a corrupção e sim “contra o incômodo que a elite branca sente ao disputar espaço com esta gente diferenciada que anda frequentando aeroportos, congestionando o trânsito e disputando vaga na universidade”. 

FUP

Quem é contra a corrupção não quer golpe e sim reforma política

O jornalista Paulo Moreira Leite, articulista do site de notícias Brasil 247, avaliou as manifestações de domingo, 15, como uma clara disputa do Estado. "Não buscam reivindicações específicas. Buscam o poder", declarou em artigo publicado nesta segunda-feira, 16.

"Sociologicamente falando, foi basicamente uma parcela de eleitores de Aécio Neves que foi para a rua. Eram cidadãos de classe média, em sua maioria. Os mais influentes do ponto de vista social social, econômico e cultural. São cidadãos que têm uma mídia que expressa seus interesses, e acessam um Estado que, do ponto de vista histórico, sempre foi organizado para servi-los".

No programa da Rádio Brasil Atual desta segunda-feira, 16, o analista político Paulo Vannuchi afirmou que as manifestações dos dias 13 e 15 mostraram que "há um choque de visões políticas bastante opostas", no país e que caberá ao governo Dilma Rousseff reverter o ataque da extrema-direita, que tenta anular os resultados das eleições de 2014 por vias não democráticas.

Para ele "o ambiente é de golpismo, de busca de saídas não democráticas", não mais no velho modelo de golpe militar, mas a partir de articulação entre o Legislativo, o Judiciário e o "partido da mídia", e que tais esforços podem ser bem-sucedidos, a menos que as manifestações do dia 13 "simbolizem uma reorientação" da parte do governo. "Se Dilma tiver coragem de fazer isso, as manifestações de sexta-feira (13) se repetirão, se ampliarão. Quem pôs na rua, na Avenida Paulista, entre 50 mil a 100 mil pessoas, é capaz de colocar 300 mil, 500 mil, igualando os números de ontem", analisa.

Segundo Vannuchi, a principal força de oposição é a grande imprensa, que pauta, diariamente, a atuação dos agentes políticos de partidos de oposição, que seguem à risca o que mandam os editoriais dos "jornalões". Para ele, "vencer o partido da mídia em um contexto econômico de dificuldade é uma tarefa muito mais difícil", mas possível, por meio da multiplicação dos esforços da mídia alternativa e da mobilização popular, mas isso vai depender das próximas ações do governo Dilma.

 

 

Já o sociólogo Marcelo Zero alerta que "quem é realmente contra a corrupção não aposta em impeachment, eufemismo para golpe, aposta na Reforma Política". Em artigo publicado no site Brasil Debate, ele destaca que "a corrupção se combate com instituições independentes de controle e com a promoção da transparência na administração pública".

Marcelo Zero ressalta que isso já vem sendo feito, lembrando que "o fortalecimento e a crescente independência de instituições como a Polícia Federal, a CGU, o Ministério Público e as procuradorias, bem como a instituição do Portal da Transparência e a promulgação da Lei de Acesso à Informação, criaram uma nova situação, na qual se torna impossível engavetar qualquer processo ou varrer qualquer suspeita para debaixo do tapete, como se fazia até um passado recente"

Para ele "passou da hora das forças políticas responsáveis baixarem a bola da disputa política sem limites e sem freios", alertando que "ou todos jogamos o jogo da democracia e do respeito mútuo ou vamos, todos nós, perder o jogo do desenvolvimento econômico e social e as grandes e inegáveis conquistas que fizemos nos últimos anos".

FUP

A nova lei do feminicídio e o controle sobre a vida [e a morte] das mulheres

Neste 10 de março, mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, entrou em vigor a Lei do Feminicídio (Lei 13.104/2015), que representa, em muitos aspectos, uma enorme conquista na longa [e ainda não finda] trajetória de reconhecimento dos direitos das mulheres. Junto com a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), este novo instituto jurídico, que insere o feminicídio no rol de homicídios qualificados, objetiva auxiliar no enfrentamento das violências contra a mulher.        

Conforme constou na justificativa do Projeto de Lei recentemente sancionado pela presidenta Dilma, entre os anos de 2000 e 2010, 43,7 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, sendo que cerca de 41% delas foram mortas em suas próprias casas, muitas vezes pelos companheiros ou ex-companheiros. Segundo Rashida Manjoo, “Relatora Especial da ONU para a Violência contra Mulheres, suas Causas e Consequências” a incidência desse tipo de crime está aumentando no mundo inteiro, repetindo-se a impunidade[1].

O reconhecimento do feminicídio, que é o assassinado de uma mulher em razão de ela ser mulher, não ocorre somente na esfera familiar. Como produto de uma sucessão de violências de gênero, este tipo de crime possui abrangência que extrapola a esfera doméstica. Por isso o reconhecimento do feminicídio é o reconhecimento do direito à vida das mulheres:

 

O que chamamos de feminicídio é o assassinato de mulheres em razão de serem mulheres, que ocorre tanto no âmbito doméstico e familiar quanto fora de casa. Sabe-se que em grande parte dos casos, o assassinato da mulher é resultado de uma sucessão de violências, assédios, estupros e incontáveis violações, de ordem física e moral. Logo, reconhecer o feminicídio como um fenômeno específico, e que merece devido tratamento legal, significa também dar nome ao produto da violência de gênero[2].

A morte, neste sentido, se constitui como última etapa destas tantas violências. Nas palavras de Lourdes Bandeira, Secretária Executiva da SPM-PR:

O feminicídio representa a última etapa de um continuum de violência que leva à morte. Precedido por outros eventos, tais como abusos físicos e psicológicos, que tentam submeter as mulheres a uma lógica de dominação masculina e a um padrão cultural que subordina a mulher e que foi aprendido ao longo de gerações, trata-se, portanto, de parte de um sistema de dominação patriarcal e misógino.[3]

O Brasil é o 16º país da América Latina a implementar a figura do feminicídio.

Na prática, o artigo 121 do Código Penal passa a vigorar com nova redação, ficando incluído o feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio. Enquanto a pena prevista para o homicídio é de reclusão de 6 a 20 anos, a pena para o feminicídio é de reclusão de 12 a 30 anos.

Para fins de aplicação da lei, considera-se que o homicídio foi cometido “em razão de condição de sexo feminino”, caracterizando, portanto, feminicídio, quando o crime envolver “violência doméstica e familiar” e/ou “menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.

A pena pelo cometimento de feminicídio é ainda aumentada de 1/3 até a metade se o crime for praticado durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto, se for praticado contra mulher menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência e, por fim, se o for na presença de descendente ou de ascendente da vítima.

É certo que a simples vigência de novos institutos jurídicos não possui o condão de alterar esta realidade de estatísticas tão alarmantes. É indispensável, em termos preventivos, que tais mudanças sejam acompanhadas de políticas públicas que possibilitem o aprofundamento das transformações necessárias para o combate às violências contra a mulher. Reconhece-se, contudo, que esta etapa legislativa significa grande avanço, trazendo amplas repercussões legislativas e também sociais.

Precisamos estar atentas/os para a identificação e punição de todos os crimes cometidos contra a mulher. 

Fonte: Costa & Advogados Associados

Facebook