Antônio Augusto de Queiroz*
O movimento sindical precisa se preparar para enfrentar a campanha de desqualificação que as forças conservadoras estão articulando com o propósito de enfraquecê-lo e desmoralizá-lo como força política e também como instrumento de representação legítima da classe trabalhadora.
O propósito de desqualificar o movimento, como força política, é o de neutralizar a capacidade de influência das entidades sindicais no processo eleitoral, especialmente após o fim do financiamento empresarial de campanha, que faz de entidades associativas, com poder de mobilização e liderança sobre determinadas categorias, um ativo fundamental nesse novo contexto político.
Para atingir esse objetivo vão utilizar a grande imprensa, o Ministério Público e o Congresso. A imprensa será a responsável por publicar denúncias envolvendo entidades e lideranças sindicais. O Ministério Público será acionado para fiscalizar e auditar as entidades, especialmente em relação ao uso dos recursos oriundos da contribuição sindical compulsória. E o Congresso para instalar comissões parlamentares de inquéritos para expor negativamente ou criminalizar a atividade sindical.
Já o questionamento da representação classista tem por objetivo enfraquecer as entidades e suas lideranças, tanto no enfrentamento às mudanças no mundo do trabalho – como a flexibilização da legislação, a terceirização na atividade-fim e a pejotização – quanto nos processos de livre negociação, já sem a prevalência da lei sobre o acordo ou convenção coletiva.
Para reduzir a resistência das entidades sindicais às mudanças na legislação vão se valer – além da tática de amedrontar os trabalhadores com o fantasma da crise econômica e do elevado desemprego – de personagens como Ives Gandra Filho, atual presidente do Tribunal Superior do Trabalho, de ministros bem posicionados no governo, como Kátia Abreu, no Ministério da Agricultura, e Armando Monteiro, no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, além da forte bancada empresarial no Congresso.
No caso do TST, a tática passa por mudanças nos enunciados do tribunal, como o que trata da indenização por dano moral. No caso dos ministros, a proposta é pressionar o governo por mudanças nas normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho, sob o fundamento de que dificultam a produtividade e a competitividade das empresas. E no Congresso passa por apresentar projetos de lei mudando a CLT, emendas à medidas provisórias com essa finalidade e projetos de decreto legislativo sustando portarias e normas regulamentadoras que criem obrigação para o empregador.
Portanto, o argumento central para mudança na legislação será de que, na recessão, as empresas só poderão preservar os empregos se liberadas do cumprimento de algumas obrigações trabalhistas. Assim, na lógica traçada, a entidade sindical que não concordar com mudanças que permitam ao trabalhador abrir mão de alguns direitos, ainda que temporariamente, estará indo contra o interesse do empregado, porque forçará a sua demissão.
Em relação às entidades e lideranças, o argumento é de que as entidades arrecadam compulsoriamente de seus representados e não os representam adequadamente, além de desviar recursos para finalidades alheias à defesa do trabalho, como supostamente nepotismo, regalias, super-salários e uso da estrutura para fins políticos eleitorais, entre outros.
As lideranças sindicais, para fazer esse enfrentamento, precisam ter clareza de que as entidades sindicais são uma das principais conquistas do processo civilizatório, de um lado, porque contribuem para distribuir renda de forma pacífica, e, de outro, porque organizam e dão suporte político e associativo aos trabalhadores.
Precisam, igualmente, ter a convicção de que a instituição sindical, como instrumento de defesa dos direitos e interesses da coletividade, em geral, e da classe trabalhadora, em particular, é um dos pilares da democracia e dispõe de uma série de poderes e prerrogativas que a credencia como ator social relevante no cenário político, econômico e social do País.
Entre esses poderes e prerrogativas das entidades sindicais, destacam-se: 1) o poder de estabelecer ação regulatória por via dos instrumentos normativos, 2) a força de restringir ou condicionar a liberdade patronal na contratação e definição de condições de trabalho, 3) a garantia de autotutela do próprio interesse, 4) o reconhecimento de certo poder extra-legal, como os fixados em acordos e convenções coletivas que celebra, os quais têm força de lei, 5) o poder de atuar como substituto processual, e 6) a prerrogativa de ingressar no Supremo Tribunal Federal com ação direta de inconstitucionalidade.
Logo, não podem as lideranças sindicais, em hipótese alguma, prescindir desse instrumento de defesa dos direitos e interesses da classe trabalhadora. A continuidade dessa instituição, entretanto, depende de credibilidade e legitimidade de seus dirigentes, cuja missão é representar, organizar, mobilizar, defender os direitos e interesses e educar o trabalhador para a cidadania.
Assim, para que as forças conservadoras não encontrem eco em seu discurso, é fundamental que as entidades sindicais sempre se pautem por boas práticas no exercício dos poderes e prerrogativas legais e extra-legais inerentes a elas. Essa é a condição para a preservação e fortalecimento dessa conquista importante do processo civilizatório, que é a organização do movimento sindical.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap