No dia 19 de junho, a Cozinha Solidária do Sindipetro-RS completa 30 dias. Mais de 20 mil marmitas já saíram das dependências da Delegacia Sindical de Canoas e foram entregues a quem perdeu tudo. Um suspiro em meio ao caos. Uma ação coletiva que vem driblando as dificuldades para levar comida aqueles que viram as suas vidas mudarem de uma hora para a outra.
As reuniões que antecederam a criação da Cozinha Solidária começaram no dia 11 de maio, quando as estradas ainda estavam bloqueadas por consequência da enchente. O deslocamento entre Porto Alegre e Canoas levava em torno de 5 a 6 horas. Mesmo com todas as dificuldades e o clima de pânico, foi batido o martelo para a criação da Cozinha, uma ação conjunta entre Sindipetro-RS com o MTST, MPA, Cáritas RS, Sindimoto, MAB, MMM e Transpetro. Com as doações dos utensílios de cozinha feitas pela Transpetro e através das doações feitas para a campanha Petroleiros Pela Vida, que subsidia os alimentos e o combustível para a entrega das marmitas, a produção tomou corpo no dia 19 de maio, quando 600 quentinhas saíram da Delegacia de Canoas. No dia 22, diante da notoriedade desse fato, uma comitiva do governo federal visitou as instalações, onde recebeu o apoio e o elogio do ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do RS, Paulo Pimenta: “Esse trabalho da cozinha solidaria é fundamental para oferecer condição e dignidade para o povo fazer essa transição nesse período tão difícil de reconstrução das moradias, fora aquelas famílias que não tem para onde voltar”.
A rotina da Cozinha Solidária é exaustiva. Requer agilidade e organização. Os voluntários não param. A falta de mão de obra sobrecarrega quem está lá. Grupos se dividem nas tarefas, que vão desde a limpeza, lavar panos, descascar verduras, separar alimentos, descarregar e organizar as doações e mantimentos que vão chegando, cozinhar, assar, montar, organizar, entregar. A jornada começa às 8h e segue até às 21h com pré-preparo para o dia seguinte. Atualmente, sete voluntários estão dormindo em colchões no auditório da Delegacia para não deixar a produção parar. Para a mineira Olivia Santiago, coordenadora da brigada de voluntários do MAB, o ideal seria aumentar o número de voluntários para fosse organizado três escalas diárias e assim não sobrecarregar quem está no trabalho desde o primeiro dia. Nessa última semana, voluntários de outros estados (SP, RJ, ES, MG e CE ) abriram mão de sua rotina para doarem o seu tempo a Cozinha Solidária. Até às 14h o ritmo é acelerado na produção. A meta precisa ser cumprida. Na última quinta-feira, 14 de junho, 899 marmitas foram distribuídas nos bairros mais atingidos de Canoas, Esteio, região das Ilhas e o Sarandi, em Porto Alegre.
A cozinha é o coração! Sem comida não tem reconstrução!
Quando a meta é atingida, um grito é ecoado. Todos aplaudem e vibram. Andreia Soares, 41 anos, é assistente social, moradora do Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre. É ela a responsável por trazer diariamente as cozinheiras e o assador. Ela está como voluntária desde a primeira reunião para a criação da cozinha. Andreia chega em Canoas 8h da manhã e já começa a ajudar na organização. Natural do Piauí, morando há 12 anos em Porto Alegre, ela conta que é a primeira vez que faz um trabalho de voluntária: “A sensação que eu tenho é que meu dever foi cumprido, de paz no espírito. No começo fiquei doente, acompanhava pela televisão as noticias sobre a tragédia. Resolvi sair da minha zona de conforto e ajudar. Eu achava que tinha algo faltava na minha vida, eu queria tirar a sensação de egoísmo, eu queria ajudar. A gente, mesmo pelos bastidores, a gente consegue sentir a felicidade de quem recebe essas marmitas. Cada voluntário que passou por aqui deixou a sua história. Já vi gente chorando muito aqui dentro, pessoas desesperadas, todos com suas bagagens e histórias de vida. Eu vou sair daqui muito maior do que entrei”.
A previsão para a Cozinha Solidária é que ela permaneça até outubro. Quando as demandas da produção de comida da uma reduzida, os voluntários vão separar e montar cestas básicas e kit de higiene das caixas de doações que chegam de outros países, como o Canadá, China e Arábia Saudita, destinadas através do Conab, pelo governo federal. Também a articulação com o governo garantiu uma grande contribuição dos frigoríficos, com o abastecimento semanal de proteínas.