Quem viveu o auge da ofensiva jurídico-midiática contra o Partido dos Trabalhadores (PT), iniciada em 2005 com o “Mensalão” e intensificada com a Lava Jato, lembra bem desses dois personagens: João Vaccari Neto e Delúbio Soares. Seus nomes encheram as manchetes e os programas de TV, sempre associados a uma palavra: corrupção.
Os dois foram os alvos prediletos de processos jurídicos que, hoje sabemos com provas, tiveram como objetivo destruir o PT e acabar com as políticas de conteúdo nacional implementadas desde que Luiz Inácio Lula da Silva chegou ao poder em 2002. Esse foi o assunto do debate da mesa da manhã deste sábado (5), que faz parte da programação do XIX Congresso da Federação Única dos Petroleiros (FUP), que ocorre desde a última quinta-feira (3) no Instituto Cajamar, localizado na Grande São Paulo.
Vaccari Neto, que era o tesoureiro do PT em 2015, quando foi preso e massacrado na mídia, resumiu a tática lavajatista durante o debate: “Primeiro, não há nada melhor do que prender o tesoureiro do partido e chamar ele de ladrão. É o cara que mexe com dinheiro, que dialoga com empresários. Aí ele [Sérgio Moro] prende, coloca na imprensa, faz a condenação prévia e diz que eu fui preso com denúncia de enriquecimento ilícito. Sessenta dias depois, quando já havia revirado minhas contas e da minha família e constatado que não tinha enriquecimento ilícito, o Moro retirou a denúncia. Mas, daí ele não faz propaganda, retira a denúncia caladinho. Aí a condenação social permaneceu”. E acrescentou sobre o chamado Lawfare: “É um processo de enganação da população e da opinião pública, colocando eles como salvadores que estavam protegendo a sociedade dos malfeitores do país, e o tempo está demonstrando que na realidade não era nada disso”.
A ofensiva
Delúbio Soares, que coordenou as campanhas presidenciais de Lula em 1989 e 1998, e também foi tesoureiro do PT, foi condenado por corrupção ativa no processo conhecido como Mensalão, e absolvido em 2014, quando passou a ser alvo também da Lava Jato. Para ele, “os poderosos não aceitaram que o governo do PT estivesse dando certo e tentaram achar qualquer motivo para boicotá-lo”.
Opinião semelhante tem Vaccari Neto sobre o tema. Para ele, havia dois motivos principais para a ofensiva judiciária. Por um lado, acabar com a atuação do presidente Lula na geopolítica, seu papel na África, na América Latina, e por outro, mudar o rumo na questão do petróleo e da indústria nacional. “Quando chegamos ao governo não tínhamos autonomia, não tínhamos soberania sobre nosso petróleo, não produzíamos o suficiente para o país. Depois veio a descoberta do pré-sal, uma legislação que os grandes países não concordaram, e foi aí que começaram a pensar em como destruir isso”, afirmou Vaccari.
O ex-tesoureiro do PT ainda emendou: “Mas não era só no petróleo, era nas telecomunicações, nos carros, na indústria como um todo. Era a ideia do conteúdo nacional, de produzir aqui no Brasil. Aí eles [capital internacional] falaram ‘peraí, eles [brasileiros] estão pensando o que, eles vão querer entrar nessa festa? Essa festa é nossa’. E foi aí que começou o processo de destruição que vivemos”.
Preso por mais de quatro anos por condenações que considera injustas, Vaccari provocou: “O primeiro ato que eles fizeram após o golpe contra Dilma foi modificar a legislação sobre o petróleo. Se a Petrobrás tivesse seguido o plano do presidente Lula, o Brasil hoje estaria produzindo 5 milhões de barris de petróleo por dia. Atualmente, produzimos 3 milhões. Então, ao Sérgio Moro tem que ser creditado 2 milhões de barris de petróleo por dia, que foi o que ele provocou de atraso na indústria do petróleo e por consequência na indústria nacional com toda a destruição que promoveu”.
O ex-coordenador da FUP, João Antônio Moraes, comentou o caráter histórico dos ataques contra a Petrobrás: “Não é de hoje que a gente enfrenta o que Nelson Rodrigues chamava de viralatismo da nossa elite econômica, traumas coloniais de um país dirigido por uma elite que não tem nenhum compromisso com a soberania. Por isso, é importante recontar a história desses dois companheiros e de tantos outros. Porque será nossa capacidade de recontar essa história que nos permitirá resistir aos ataques futuros”.
Após mais de uma década sem falar com a imprensa, e sofrendo forte perseguição jurídico-midiática, Delúbio Soares acredita que o jogo está virando: “Eu não desejo nem que meu maior inimigo passe pelas dificuldades que nós passamos. Mas estou orgulhoso de ter ficado de cabeça em pé, sempre acreditando que não era pessoal, que era parte da política. Hoje conseguimos sair e dar a volta por cima, estamos conversando com vocês e em cada lugar que temos ido fomos bem recebidos pela militância”.
Foram esse apoio e essa resistência, acredita Soares, que permitiram passar por esses ataques e sobreviver: “Houve momentos em que nosso trabalho era o silêncio, mas sempre há o momento de dizer a verdade. A resistência é fundamental. Assim como a coragem política e nossa união para construir um novo país. Cada gesto de resistência, cada grito de bom dia em Curitiba fez com que a gente se sentisse abraçado”.
O coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar, foi contundente em sua intervenção: “Em momento algum a FUP vacilou com relação aos temas que aqui estão sendo colocados pelos companheiros Delúbio e Vaccari, seja no Mensalão, como também no Petrolão. Nunca ficamos em cima do muro, como infelizmente ficaram alguns setores da esquerda e até mesmo do próprio PT, que ouviram o canto da sereia e hoje fazem coro não só com a direita, mas com a extrema direita”.
Bacelar ainda apontou a atual realidade vivida na Petrobrás: “Nós ainda temos, infelizmente, lavajatistas na empresa, na gerência executiva, nas gerências regionais, e precisamos ter muita sabedoria para combater isso, pois é necessário lutar contra isso para superar as dificuldades que se impõem para fazer as mudanças que a Petrobrás precisa”.
No fim do debate, Delúbio citou Sócrates, o filósofo grego: “Com o tempo, as coisas vão se esclarecendo. Porque como disse o filósofo grego [Sócrates], a mentira não vive o suficiente para envelhecer. Quero repetir para todos os companheiros que estão aqui: a mentira está sendo esclarecida”.
Já Vaccari agradeceu a solidariedade do partido e das entidades sindicais e finalizou afirmando: “Não podemos parar. Temos que continuar contestando e temos que fazer com que o Brasil seja nosso, que tenhamos autonomia e soberania sobre nosso país. O projeto que estava em curso com o Bolsonaro não era esse, era entregar nossas riquezas e nossas empresas para quem quisesse e tivesse dinheiro. Por isso nossa razão é lutar e continuar lutando”.
FUP