O tema do 10º Encontro de Mulheres Petroleiras da FUP “Rompendo Barreira” ultrapassou a temática e foi ampliada na formatação do próprio encontro. No sábado (26), segundo dia de atividades, em vez de uma mesa composta com palestrante, a programação propôs uma Roda de Conversas, onde as trabalhadoras petroleiras trocaram experiências de superação, a partir das vivências de quem já está aposentada e com muitos anos de histórias e de quem chegou na empresa mais recentemente.
Num primeiro momento da Roda, as trabalhadoras petroleiras aposentadas contaram seus casos, recheados de lembranças, algumas emotivas, outras tristes, mas todas com o gosto da superação. E não foram poucas, desde o momento em que elas começaram a entrar da empresa nas áreas operacionais, ultrapassando os muros dos cargos definidos como “femininos”.
NOSSA LUTA VAI SER PARA RESGATAR O QUE FOI RAPINADO
A primeira a colocar suas experiências foi Rosângela Buzanelli, hoje representante dos/as trabalhadores/as da Petrobrás no Conselho de Administração da estatal. Segundo ela, desde o início e até hoje, há um convívio predominantemente com homens, o que lhe trouxe bastante experiência desde que entrou na empresa. Mas a militância começou bem antes, ainda no movimento estudantil, em defesa da Amazônia, nos diretórios acadêmicos da Universidade de Minas Gerais e em outros espaços. Mas sempre convivendo em ambientes conservadores, com reações machistas inclusive de muitas mulheres. “Isso me ensinou a primeira lição, que a gente não tem que pedir licença, não podemos nos intimidar e nunca desistir dos nossos sonhos e esses são os ideais que nos movem hoje dentro da Petrobrás”, pontuou ela.
Ela conta que já na Petrobrás teve que quebrar diversos paradigmas, inclusive seus. “Atuando em várias unidades na Amazônia, Paraná e diversas outras cidades do país, eu tinha que me impor às vezes com mais de 200 homens, a maioria os próprios colegas. As lutas eram de todos os tamanhos, como por alojamentos femininos, banheiro separado, mas a gente vai rompendo com essas barreiras”, relembrou.
Rosângela vai além e diz que viver como mulher é um desafio diário. “No mecânico, em casa, em todos os lugares em um mundo em que parece que a força bruta é o que domina. Estamos sempre sendo desafiadas. Por isso, encontros como este, onde podemos trocar energia, nos fortalece muito, tanto que para este cargo no CA, o que virou a chave, foi o apoio e a segurança para assumir este cargo que recebi do Coletivo de Mulheres”, revelou.
No CA ela frisou que não tem sido fácil, não só pelo ambiente masculino, mas por estar presenciando toda a destruição e o sequestro da Petrobrás. “Mas estamos lá levando a posição das mulheres petroleiras e de toda a categoria. Nossa luta é e continuará sendo para resgatar o que foi rapinado”, finalizou.
NINGUÉM LARGA A MÃO DE NINGUÉM
O chavão que tem sido usado desde 2016, simbolizando a necessidade da luta unificada para manter a democracia e os avanços conquistados por diversos setores da sociedade, foi a temática da colega Célia Tremea. Segundo seu relato, ela foi da primeira do concurso que incluiu mulheres para trabalhar na Utilidades. Foram admitidas três mulheres, mas só ela permaneceu. Não havia, à época, sequer vestiários nas unidades e elas tinham que deslocar para usar o vestiário de outra unidade. Foram momentos difíceis e episódios até graves. Mas nunca desistiu de lutar, o que lhe rendeu uma carta de demissão. Mas nem isso a amedrontou e, ao contrário, foi para a frente da Refinaria pedir ajuda aos colegas para garantir seu emprego. Sofreu acidente, foi hospitalizada, ficou grávida e resistiu. “É uma carreira que se confunde com a minha vida”, pontuou.
Sobre a que estão chegando mais recentemente, ela diz que reclamam muito e algumas com razão, nas é porque não conheceram as condições de trabalho antes. A todas ela dá um recado: “Temos que continuar forte, com muita unidade, porque os próximos anos não serão fáceis. Para reverter tudo que foi destruído é importante ninguém largar a mão de ninguém”, finalizou.
DE COSTUREIRA A GREVISTA
Muitos relatos mostram que a luta não começou na categoria petroleira. Lindomar Meneses do Nascimento, do Sindipetro-BA, era chamadas por muito de “linda pimenta, linda diabo, linda grevista” que identificavam sua rebeldia e o seu caráter revolucionário. Foi de costureira à grevista, passando por funcionária de banco. E foi no banco, abrindo contas para petroleiros, que entrou em contato com a categoria que depois veio a integrar, trabalhando numa cidade pequena, na Bahia, com todas as adversidades e agressividades iniciais. “Para mim foi uma escola, um aprendizado”, confessou.
Linda revelou que nunca perde um movimento de greve, e hoje, aposentada, sua principal saudade são os encontros, as greves.
CONSTRUÍ MINHA ROTA A PICARETAS
Kátia Duarte Machado, 32 anos de Refap, antes era professora e conta que quando entrou o ambiente era muito hostil e machista. Mas com o tempo foi mudando e ficando melhor. Ela contou que o início foi muito difícil, e não foram poucas as vezes que entrou no ônibus de volta para casa chorando. “Mas o que aconteceu foi que, depois de uma crise existencial, tentei encontrar uma rota para atuar na minha área, uma rota que construí a picaretas. Acabou que com a gravidez fui para a área ambiental. Enxergo a Petrobrás com potencial para construir atitudes ambientais efetivamente corretas e não só o que determina a lei. Temos condições de qualificar outras pessoas. A Petrobrás pode ir muito além na produção de conhecimento, trabalhar numa matriz energética de petróleo, fazer a transição de uma maneira completamente exemplar. Temos recursos e corpo técnico para isso”, concluiu.
Mas embora nem tudo sejam flores, há alguns lugares melhores, entre os depoimentos não faltou o reconhecimento de locais onde, felizmente, mesmo em alguns setores de embarque e desembarque, mulheres não sofreram discriminação.
UMA MULHER PRESIDENTA DE SINDICATO É MUITO IMPORTANTE
Fátima Viana, do Rio Grande do Norte, comemorou o fato de no RS, o Sindicato de petroleiros ser presidido por uma mulher, segundo ela, uma grande conquista. Para ela, ser mulher na Petrobrás já é romper barreiras, ter uma mulher no sindicato é uma vitória, numa categoria onde as mulheres ainda têm que brigar para ter banheiros femininos, alojamentos. “Hoje as mulheres resistem, mas infelizmente, ainda convivem com o machismo, inclusive dentro do movimento sindical. Por isso é preciso crescer o número de mulheres nos sindicatos e por isso a eleição da Miriam para o SINDIPETRO-RS é uma grande conquista do movimento sindical”.
SÍNDROME DA IMPOSTORA
A Síndrome da impostora é um problema que afeta muitas mulheres e representa a baixa confiança das mulheres na vida profissional, e faz com que elas não se sintam, por vezes, em condições de ocupar espaços importantes de decisão, fruto do machismo estrutural. O conceito, frequentemente usado para se referir às barreiras emocionais e ao sentimento de inadequação enfrentados por muitas mulheres em suas carreiras, vem sendo agora questionado por especialistas, sob o argumento de que a síndrome foca em consertar as mulheres, em vez de consertas os locais onde as mulheres trabalham.
A síndrome da impostora foi identificada pela primeira vez por duas psicoterapeutas norte-americanas em 150 mulheres de sucesso no final dos anos 1970. Geralmente está relacionada a sintomas clínicos percebidos pelas pesquisadoras nas mulheres analisadas, como ansiedade, falta de confiança, depressão e frustração. Segundo Clance e Imes, todas eram reconhecidas no mundo acadêmico e profissional, mas não tinham um “senso interno de sucesso”. Se consideravam, portanto, “impostoras”.
Entre os que questionam estão especialistas que vinculam a situação a falta de uma dimensão mais profunda ao debate sobre a síndrome da impostora, pois pouco se explora os motivos pelos quais ela ocorre, como os próprios ambientes profissionais que continuam equivocadamente focados em buscar soluções individuais para questões desproporcionalmente causadas por sistemas de discriminação e abuso de poder.
O 10º Encontro de Mulheres da FUP seguiu na parte da tarde com debate e avaliação sobre os 10 anos de criação do Coletivo de Mulheres da FUP.
Assessoria de Comunicação
26/11/2022 17:56:40