Recebemos com indignação e tristeza a notícia da perda de mais uma companheira pela violência do patriarcado. Na tarde de ontem, foi assassinada Débora Moraes, integrante da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em Porto Alegre. Era uma mulher jovem, mãe, alegre e aguerrida, que se colocava na linha de frente da luta por justiça. Débora tinha acabado de conquistar o direito ao reassentamento e, sequer, pode vivenciar sua conquista. O marido de Débora foi detido na cena do crime e levado pela polícia. Ela deixa uma filha de 6 anos.
O patriarcado se estrutura como um sistema de dominação das mulheres e se reproduz por meio da violência. Violência que hoje tira a vida da nossa companheira Débora, e que, todos os dias, tira a vida de uma mulher a cada 6 horas e meia, segundo os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. E quantas outras mais não têm suas mortes notificadas?
O ódio contra nós mulheres e o desejo de controle sobre nossos corpos e nossas vidas está fortalecido hoje no Brasil e encontra expressão no governo de Jair Bolsonaro. O estímulo à violência, o deboche diante da morte e o machismo escancarado marcam seu discurso e suas ações. A piora nas condições de vida, a perda de empregos e o abandono de políticas sociais também agravam a situação e nos deixam ainda mais expostas à violência. Diante da perda de nossa companheira, reafirmamos o compromisso em lutar para derrotar de uma vez por todas o projeto de morte do bolsonarismo.
Nossa companheira foi vítima de um tipo de guerra que acontece todos os dias dentro de casa e também nas ruas. No início pode não fazer tanto barulho, ser sutil, silenciosa, cheia de dor e de marcas escondidas. Até que em um dia, essa guerra alcança a mais cruel, dolorosa e desumana forma: o não poder viver.
Assim, a violência contra as mulheres vai acontecendo no dia a dia, nas palavras que ameaçam, ridicularizam, humilham e manipulam. No controle das ações, dos comportamentos, das crenças, dos recursos financeiros. Acontece no empurrão, no tapa, no chute. Acontece no controle do corpo feminino pelo homem.
A violência contra as mulheres é ainda pública e perpetrada por uma cultura misógina e patriarcal que atravessa a nossa história, fazendo de nossos corpos espaços públicos de decisão e de poder dos outros. Fazendo das mulheres mercadoria.
Nessa cultura de violência, 2 em cada 3 mulheres vítimas de feminicídio no Brasil são negras: índice que é resultado da união devastadora do sistema patriarcal e do racismo que estruturam o capitalismo e sua reprodução. O feminicídio tem cor e tem classe e deixa filhos e filhas órfãos e mães e pais sem filhas, deixa um vazio para sempre na vida daqueles que ficam.
Nós mulheres atingidas por barragens do MAB nos solidarizamos com a família, amigos e camaradas de luta da companheira Débora. Nesse momento de dor e revolta, não silenciaremos. Levantamos nossas vozes pelo fim da violência contra as mulheres, dizemos basta ao femincídio. Conclamamos que é preciso acabar com a raiz do problema a partir do debate e de ações práticas, que tratem das desigualdades históricas que fazem com que o gênero, a raça e a classe estruturem dinâmicas de opressão. Exigimos das autoridades justiça e politicas de proteção às mulheres. Queremos o fim deste governo genocida, racista, misógino e LGBTfóbico e lutamos por direitos iguais e uma cultura de paz.
Seguimos em luta por Débora, Dilma, Nicinha, Bertha, Marielle, Dorothy e tantas outras companheiras cuja força nos inspira a continuar. Assim como os rios, que crescem quando se juntam, nós – mulheres atingidas – reunimos nossas resistências em cada grupo de famílias, comunidade, e reassentamento, em cada periferia e reafirmamos que a nossa luta é pela vida das mulheres.
Dos rios de todo o Brasil, 13 de setembro de 2022.
Débora Moraes, presente! Presente! Presente! Mulheres, água e energia não são mercadorias!