Convidado para o XVII Confup, o professor da PUC-SP, Pedro Serrano, fez uma rápida análise sobre democracia, Estados de direito e de exceção. A explanação feita pelo docente não é positiva: vivemos um momento de perca de direitos, provocada por lapsos de ditadura e ascendência do fascismo. Veja abaixo como o Serrano chegou a essa conclusão com tópicos que seguem uma linha explicativa da conjuntura atual:
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADE
Segundo o professor, as revoluções norte-americana, inglesa e francesa trouxeram a mudança do conceito de soberania, quando as pessoas eram servas dos senhores soberanos e não havia a ideia de direitos mínimos e liberdade. E isso foi secularizado até que surgir o que ele chama de nova ideia de autoritarismo: Estados de exceção. Porém, a exemplo do que já aconteceu na Europa, os Estados autoritários assumem o poder pelo voto: vencem eleições e vão ganhando poderes a partir disso, através de instituições democráticas e processos democráticos, vão modificando a própria democracia.
Ao citar um exemplo de comparação, Serrano disse que um milagre altera o estado normal da natureza, então essa ideia de que direitos fundamentais humanos são bons para gerir a normalidade, ou seja a paz.
DITADURA x ESTADO DE EXCEÇÃO
Para o professor, a ditadura de 64 foi um golpe violento, mas tinha algum clamor popular. Já os Estados de exceção têm seus inícios apoiados por grande parte do próprio povo, trabalhadores e operários. Como o exemplo do surgimento do governo ilegítimo de Michel Temer, apoiado por setores da burguesia, da classe média e da grande mídia.
RENOVAÇÃO DO CAPITALISMO E A FARSA DO ESTADO MÍNIMO
A partir da década de 70, Serrano sugere que há uma mudança no capitalismo: com a junção do capital financeiro, tecnológico e militar. “Ao invés de dinheiro gerando mercadoria, agora é dinheiro gerando mais dinheiro. Cada vez passando a ser menos material, cada vez mais dinheiro, e no futuro será dinheiro virtual. E isso dá um grande poder pro capital”. Isso acaba fazendo nações reféns financeiramente de outras, o que seria o caso do Brasil.
“Eles passam a ideia de que pra esse capital poder fluir pelo mundo, tem que ter Estado mínimo e liberdade de mercado, mas esses capitalistas na verdade não querem a mão invisível do mercado, eles não querem Estado mínimo, eles querem é um Estado que não dê direitos para as pessoas”. Os Estados Unidos é a maior potência que já existiu em história da humanidade e quer simbolizar a ideia de que é estado minimo, mas na verdade comanda o mundo e pratica violência mundial.
Não existe ideia de liberdade de mercado, pois a segurança passa necessariamente pela regulamentação do Estado.
DESIGUALDADE SOCIAL E VIOLÊNCIA
Nunca houve tanta desigualdade social no mundo, na Asia diminuiu a fome, mas a desigualdade permanece, e “a única coisa que se sabe sobre a violência é que desigualdade social gera violência, pois todos os desiguais tem sua proporção diretamente ligada à violência. “Na década de 90 pra cá, quadruplicou-se o numero de presos, hoje estamos com 600 mil presos. Hoje nós temos 60 mil pessoas por ano mortas pelo Estado indiretamente, gente pobre matando gente pobre, trabalhador matando trabalhador”, afirma.
PERCA DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS
Serrano afirma que a constituição de 88 é considerada uma das mais avançadas do mundo, mas foi modificada no governo de Fernando Henrique Cardoso, e os direitos que vão de liberdade e direitos sociais vão sendo negados. Essas modificações vão sendo travestidas de medidas democráticas, mas que se mostram medidas de exceção, que são trechos de ditadura dentro de uma democracia.
PODER JUDICIÁRIO, O AGENTE DE EXCEÇÃO E A ‘RALÉ’
No Brasil houve um golpe que retirou a presidente eleita pelo voto popular; um golpe claro na democracia, mas o respaldo do Poder Legislativo, com apoio do poder judiciário, não explicita a ascensão de um novo governo, como no caso de um golpe violento de tomada de poder. Honduras, Paraguai e Brasil tiveram interrupções nas suas democracias de formas semelhantes, com confirmações do poder judiciário.
Esse mesmo poder judiciário passa a agir de acordo com a lógica da mídia e a lógica da política. Essa mídia cria a base social, denominada por alguns autores de “ralé”, (que podem ser ricos e pobres conflitantes entre si, mas buscam um resultados políticos, essa nomenclatura surgiu para nominar os primeiros nazistas). “E a ‘ralé’ vai atrás sempre de uma figura, que pode ser um líder, que signifique para ela que simboliza a pessoa com capacidade de fazer ordem e acabar as divisões, de transformar a sociedade em algo puro e unitário, que ‘não são contaminados pelos pecados da política’ para buscar ordem”, completa Serrano.
Essa ralé vai atrás quem seja superior moralmente a média das pessoas, que acreditam ter capacidade de combater o crime e unificar a sociedade. Porém, não há democracia sem pluralidade e divisão social, e quem nega isso é o fascismo.
RALÉ + JUDICIÁRIO + MÍDIA = PERSEGUIÇÃO AO LULA
Nos últimos anos, o poder judiciário brasileiro aumentou com leis sancionadas por Lula e Dilma. Entre essas leis, a delação premiada usada no caso do Triplex de Lula é considerada um abuso do poder judiciário, cujo o ex-presidente tem 70 testemunhas o inocentam, sendo acusado pelo depoimento de um delator sem provas.
“Tem absurdos que existem no caso Lula, ele é acusado por receber o triplex, que seria o chefe de uma organização criminosa e iria negociar uma cozinha”. Serrano lembra que no processo não tem um funcionário público envolvido,e questiona quem dentro da Petrobrás negociou os contratos. O juiz Moro então muda a acusação dizendo que o recebimento dos benefícios seriam recebidos no futuro e o tribunal respalda uma situação excepcional, tudo apoiado pela mídia, com pressão da ralé, o que explicita um fenômeno estratégico político denominado Lawfare.
“O que acontece com o Lula é o que acontece com o povo pobre das periferias, ele é nordestino, veio do Nordeste para São Paulo de pau de arara, perdeu o dedo como milhares de trabalhadores se acidentam, vira presidente e é condenado a uma pena absurda. Ele foi a única esperança dos excluídos do mundo, deu apoio aos governos da América e destacou-se no mundo como uma liderança, criou o BRICS, mexeu num vespeiro e tá tendo agora consequências do que ele mexeu”, finalizou.