O movimento pelo Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político entrou na reta final no último dia 12 com um ato no centro de São Paulo e objetivo de colocar na agenda nacional muito mais do que faz supor a única pergunta que os cidadãos irão responder na consulta, marcada para ocorrer entre os dias 1° e 7 de setembro: "Você é a favor de uma Constituinte Exclusiva e Soberana sobre o sistema político?"
Segundo a Secretaria Operativa Nacional do movimento, 373 entidades – movimentos sociais e sindicais, associações e partidos políticos – trabalham pelo plebiscito. Já foram criados cerca de mil comitês populares no país. Os ativistas que trabalham no movimento e, consequentemente, por uma reforma política ampla e com participação popular, não acreditam que mudanças significativas possam ocorrer no âmbito do Congresso Nacional.
“O conservadorismo dentro do Legislativo impede que existam mudanças com esse caráter de ampliar a participação popular. Eles até têm propostas de reforma política, mas não com participação popular. A única forma de criar essa participação popular é através de um processo pedagógico. É por isso que os movimentos sociais constroem essa ferramenta do plebiscito popular”, explica Alberto Marques, integrante do Levante Popular da Juventude de São Paulo. “A proposta do plebiscito, originalmente, foi da presidenta Dilma, em junho do ano passado, quando a juventude brasileira saiu às ruas para pressionar por mudanças na política, mas o Congresso Nacional rechaçou essa proposta.”
Além do “gancho” da proposta da presidenta Dilma Rousseff, os militantes se inspiram nas manifestações do ano passado, a partir das quais foi proposto o plebiscito, claramente boicotado no Legislativo. Na época, a presidenta apresentou cinco tópicos a serem decididos em plebiscito: a forma de financiamento de campanhas a ser adotado; definição do sistema eleitoral; continuidade ou não da existência da suplência no Senado; manutenção ou não das coligações partidárias; fim ou não do voto secreto no Parlamento.
A RBA publica reportagens especiais sobre as eleições. Dentro da agenda que consideramos prioritária para o país, elegemos abrir os trabalhos com a reforma política, assunto que não é tratado como prioridade pelas campanhas. Numa disputa eleitoral em que empresas doadoras de partidos e candidatos jogam papel decisivo, entendemos que essa reforma é instrumento fundamental quando se pensa no surgimento de um modelo de Estado que atenda, de forma equilibrada, as necessidades e anseios da sociedade brasileira considerando a sua pluralidade.
A consulta popular de setembro não tem caráter oficial. A convocação de um plebiscito é, de acordo com a Constituição Federal de 1988, competência exclusiva do Congresso Nacional.
Porém, a avaliação dos movimentos é de que uma representação real da sociedade brasileira no Congresso, com negros, mulheres, indígenas e jovens, somente pode ser concretizada pela reforma política feita por um parlamento eleito exclusivamente com esse fim.
A intenção é conseguir mais de 10 milhões de "votos", número atingido pelo plebiscito popular realizado em 2002 contra a adesão do Brasil à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A iniciativa, de 12 anos atrás, é considerada pelos ativistas a principal referência. Na ocasião, 98% disseram não à assinatura do acordo de interesse dos Estados Unidos, descartado em 2005 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Embora o movimento seja amplo e, por isso, muitas entidades tenham sugestões para uma reforma política, existem cinco pontos considerados consensuais e que teriam, para o movimento, necessariamente de ser introduzidos no país por mudanças a partir de uma Constituinte exclusiva, caso ela venha a funcionar de fato: financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais; voto em lista fechada e pré-ordenada; paridade de gênero nas listas partidárias; fim das coligações proporcionais – que permites nos estados coligações contraditórias à estabelecida em plano nacional; e ampliação dos mecanismos de democracia participativa (neste caso, a própria competência de se convocar um plebiscito seria ampliada, já que o Congresso, detentor dessa prerrogativa, não é mais considerado um parceiro confiável da sociedade civil).
Para os organizadores, as coligações proporcionais são um exemplo das contradições do sistema político brasileiro. Em São Paulo, por exemplo, o PSB é coligado ao PSDB; no Rio de Janeiro, ao PT. Assim, uma votação expressiva de um candidato a deputado federal pelo PSB em cada estado pode ajudar a eleger petistas no Rio e tucanos em São Paulo. Uma possibilidade que "deseduca" os cidadãos a identificar os programas dos partidos e dos candidatos antes de se decidir.
O financiamento público exclusivo de campanhas é o primeiro a ser mencionado praticamente por dez entre dez militantes em qualquer ato político pelo plebiscito, como o que ocorreu no dia 12 em São Paulo. “As mudanças verdadeiras não vão ser feitas por esse Congresso das empreiteiras e do fundamentalismo religioso. Precisamos acabar com o financiamento privado de campanhas”, discursou na ocasião Thiago Aguiar, do Movimento Juntos.
Não é por acaso que o financiamento privado das campanhas políticas é considerado a mais nociva fonte de corrupção decorrente do atual processo eleitoral brasileiro. “Temos de esclarecer o eleitor que a corrupção, muitas vezes, nasce da obrigação dos eleitos de retribuírem aos financiadores aquilo que receberam na campanha e que a moralização do processo eleitoral passa pela sua desprivatização e por tornar a atividade partidária e eleitoral uma atividade pública”, afirma o deputado federal Renato Simões (PT-SP).
“O financiamento privado assegura ao poder econômico a influência sobre o poder político. Isso faz com que as empresas elejam seus candidatos. Quem paga a banda, escolhe a música. (Os políticos) são eleitos por doações que, na verdade, não são doações, são investimento. A empresa investe numa campanha e depois cobra um retorno muito grande que compromete os interesses do povo no Legislativo”, acrescenta Marques, do Levante Popular da Juventude.
Gigantes como Camargo Corrêa, OAS, Andrade Gutierrez, Gerdau, Bradesco, Itaú/Unibanco, Santander, Friboi, Ambev e Votorantim são algumas das empresas que mais contribuem com as campanhas eleitorais.
Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2010 o gasto com a campanha de um deputado federal era, em média, de R$ 1,1 milhão. A estimativa subiu para R$ 3,6 milhões em 2014. Para um senador, o gasto foi de R$ 4,5 milhões para R$ 5,6 milhões.
De acordo com dados divulgados durante os votos do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI n° 4.650) no Supremo Tribunal Federal, os gastos totais das eleições de 2002 para presidente da República, governadores, deputados e senadores foram de R$ 827 milhões. Em 2010, os valores chegaram a assombrosos R$ 4,9 bilhões.