Nov 24, 2024
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Profissionais reivindicam bermuda no escritório

Ao encontrar amigos de outras empresas durante o almoço do expediente, Alberto Pirro, diretor de desenvolvimento organizacional da rede de varejo carioca Casa & Video, já teve que explicar que a bermuda que estava trajando não era sinal de desemprego. A permissão para usar a peça de roupa no ambiente de trabalho faz parte da nova política de vestimenta que a empresa iniciou neste verão - período que já registrou calor acima dos 40 graus no Rio de Janeiro. "Depois que explico, meus amigos ficam com inveja", diz Pirro.

Desde novembro os funcionários das lojas e da sede administrativa da Casa & Video não precisam se vestir com calça comprida para ir trabalhar. "Somos uma empresa que está 100% no Rio de Janeiro e precisamos nos posicionar de forma coerente em relação ao clima do Estado", explica. A medida é uma resposta a preocupações que já vinham surgindo nos últimos dois anos por causa do calor, afirma o diretor, e busca promover mais conforto para os funcionários, que muitas vezes passam horas no deslocamento até o trabalho.

Como 80% do quadro da empresa lida diretamente com o cliente, houve a preocupação de criar uma comunicação clara, "para evitar excessos". Segundo Pirro, a política exige que as bermudas cheguem ao joelho e que nas lojas sejam jeans, para uniformizar os atendentes.

Segundo ele, a adesão dos profissionais foi tímida no início. Foi quando Pirro e os outros diretores decidiram dar o exemplo e passaram a trabalhar de bermuda todos os dias. Hoje, com a aceitação cada vez maior em todos os níveis, o diretor diz que há intenção de continuar com a prática mesmo depois que o verão acabar. "A liberação foi vista com bastante simpatia pelas pessoas, dá um tom de cuidado com elas. Nas lojas, o cliente vê que está sendo atendido por alguém que está mais confortável", diz.

O executivo comenta que ainda costuma trocar a bermuda por uma calça social quando recebe visitas de clientes ou fornecedores mais formais. No entanto, alguns deles já começaram a ir às reuniões também de bermuda. "É interessante, porque mostra que há um feedback positivo de fora", diz.

Assunto em voga neste verão, a flexibilização do que é exigido pelas empresas no que diz respeito ao vestuário dos funcionários não acontece apenas em razão do calor. A consultora de imagem Silvana Bianchini considera que o mundo hoje está mais casual, o que reflete hierarquias menos fortes nas organizações. Ainda assim, isso acontece de formas diferentes em cada segmento. "A imagem passada pela vestimenta dos funcionários precisa estar alinhada com a identidade e a cultura da companhia", diz.

Assim, em lugares onde a criatividade faz parte da proposta, como agências de comunicação, é coerente liberar o uso de roupas casuais. Já em segmentos mais técnicos, a consultora defende uma aparência mais social. Por isso muitas empresas formalizam as exigências por meio de um código que incentive ou desestimule o uso de determinadas peças de roupa, o famoso "dress code". "Essa flexibilização é um movimento natural. O que não pode é exagerar, senão vira bagunça. Os clientes, parceiros e fornecedores enxergam no funcionário a imagem de toda a empresa", diz.

Surgido no início deste ano, o site Bermuda Sim, criado por três publicitários cariocas, quer ser um aliado dos profissionais na busca por uma aceitação maior da peça de roupa informal no mundo corporativo. Por meio da página na internet, é possível cadastrar o e-mail do chefe para que o site envie uma mensagem anônima pedindo a permissão para usar bermudas no escritório.

Em um álbum na página do site no Facebook, empresas como o Peixe Urbano e a Telelistas.net, junto com algumas dezenas de agências de publicidade e comunicação, anunciam que já aboliram a obrigatoriedade das calças compridas. O site, que começou focando empresas da capital do Estado do Rio de Janeiro, acabou de ser reformulado para se lançar como "movimento nacional".

Guilherme Anchieta, um dos criadores, estima que o site receba hoje uma média de dois mil e-mails diariamente. "As empresas que estão aderindo são muitas e dos mais variados setores, em todo o Brasil", diz. Para ele, a tendência a informalizar o ambiente de trabalho vai além da vontade de mais conforto no verão brasileiro. "As pessoas passam cada vez mais tempo no trabalho e o mínimo que se espera é que elas se sintam bem nesse ambiente", diz.

Ainda que distantes da possibilidade de adotar bermudas no dia a dia, os advogados do Rio de Janeiro também buscam a permissão para se vestir mais de acordo com as altas temperaturas do verão carioca - no caso, pedem o fim da obrigatoriedade de uso de paletó e gravata nos tribunais e fóruns do Estado.

Após registrar casos de tontura e pressão baixa entre os profissionais, a Caixa de Assistência dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro (Caarj), braço da OAB-RJ, lançou neste mês a campanha "Paletó no Verão, não!". "É uma tradição europeia adequada a um clima, que a gente importa mesmo vivendo numa realidade completamente diferente", diz o advogado Marcello Oliveira, presidente da Caarj. "O compromisso com o trabalho nada tem a ver com vestimenta. O profissional se faz pela postura", enfatiza.

O pedido foi adotado pela 1ª vara de Órfãos e Sucessões da Capital e por nove fóruns no interior do Estado. Na semana passada, o Tribunal de Justiça publicou um aviso conjunto de que o uso de terno e gravata é facultativo até 21 de março nas dependências dos fóruns e em despachos com juízes de primeiro grau, mas continua obrigatório em audiências. Oliveira diz que recebeu a decisão com "certa apreensão". "Foi um avanço, pois a decisão reconhece os males do calor para a saúde. A dispensa, no entanto, tem abrangência muito limitada", diz. Segundo ele, a campanha da Caarj vai continuar a buscar uma maior conscientização junto a advogados, clientes e o poder judiciário.

Em São Paulo e nas outras cinco cidades onde está presente, o escritório de advocacia Machado Meyer já adota há anos o "casual summer", costume comum em Nova York que foi importado pelo escritório brasileiro por causa do contato com clientes estrangeiros, segundo o sócio Celso da Costa. De primeiro de novembro a 30 de março o "dress code" do escritório permite que a vestimenta dos advogados seja diariamente a mesma das sextas-feiras ao longo do ano: calça social e camisa, sem paletó ou gravata, no caso dos homens, e roupas mais leves e menos formais no caso das mulheres. Peças como jeans, leggings ou tênis continuam fora das opções.

"Os advogados sempre serão os últimos a abandonar a formalidade, é algo inerente à profissão", diz Costa. Para o sócio, além de propiciar maior conforto para os profissionais durante o verão, a política também representa uma evolução das convenções daquilo que representa qualidade no serviço prestado. "O cliente quer o trabalho bem feito e um bom atendimento, e que as pessoas estejam vestidas adequadamente - e esse 'adequadamente' muda de acordo com o contexto", afirma.

O Itaú Unibanco aboliu a necessidade do uso de gravatas em 2011, quando reformulou o "dress code" da empresa. Hoje, o traje formal só é exigido entre profissionais que têm contato direto com clientes. "É importante trazer essa informalidade sem esquecer quem está do outro lado. A roupa formal para quem lida diretamente com o público ainda é muito do que representa ser um banco, ter a seriedade da responsabilidade de lidar com o dinheiro da pessoa", explica a superintendente de desenvolvimento organizacional Renata Oliveira.

Hoje o "dress code" casual profissional - identificado pelo uso de camisa social e calça, mas sem necessidade de gravata ou paletó - já chega até a presidência do banco. "Colocamos na balança e vimos que é possível ser uma empresa séria, com responsabilidade, e ao mesmo tempo ter essa informalidade no ambiente de trabalho", diz Renata.

Para quem estiver considerando "burlar" as exigências da empresa no verão ou em qualquer outra época, a consultora Silvana reforça que a imagem no meio profissional ainda pesa muito. "Um traje impróprio pode desviar a atenção da sua mensagem. Elementos neutros fazem o discurso falar mais alto que a aparência", afirma.

Valor Econômico

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