Nós estamos sendo atacados. Quem somos nós? É difícil nos definir. Temos tipos diferentes. Somos de raças e idades diferentes. Nossos cortes de cabelo, formatos do nariz, formatos de orelhas, gostos musicais, manias, interesses, preocupações, alergias, saldos bancários e cheiros corporais são variados, e torcemos por times diferentes. Mas, no momento, o que deve nos unir é o fato, agora inegável, de que estamos sendo violentamente atacados pelo nosso próprio governo. Temos que esquecer nossas diferenças e nos concentrarmos nesta verdade nua e crua: que isto não é um país, isto é uma zona de guerra. E eles atiraram primeiro.
Cada novo pronunciamento do Bolsonaro é um morteiro que nos atinge. Cada nomeação esdrúxula para o governo mais estranho da nossa História parece ter sido feita especificamente para nos obrigar a usar a palavra “esdrúxula”, o que inibe qualquer reação mais séria. Temos o governo civil mais militar que o país já conheceu, para nos confundir. Aguarda-se a explicação que nosso futuro embaixador em Washington dará para isso, e em que língua.
A campanha mais intensa deles contra nós é a que está começando agora, com um ataque frontal à inteligência brasileira. Verbas para a pesquisa estão sendo cortadas — às gargalhadas, não duvido — e isso é apenas o começo de cortes que virão em todo o sistema educacional, o primeiro sacrificado onde quer que “o mercado” derrote o bom senso. Para ganhar esta guerra pelos cérebros da nação, um lado tem a força e a tesoura; e o outro tem só a indignação estéril — mas que pode surpreender. Os estudantes estão voltando às ruas.
Pelas pesquisas de avaliação, a popularidade do Bolsonaro e a aprovação do seu governo estão caindo. Pesquisas de opinião são enganosas, podem refletir o entusiasmo de um momento e nada mais. De qualquer maneira, nós, mesmo desorganizados, estamos começando a nos mobilizar.
Luís Fernando Veríssimo, em crônica para o jornal OGlobo, do dia 05 de setembro.