Ilusão 1 – o fim do Estado de Exceção
Alguns sonhadores acreditavam que, consumado o objetivo do golpe – o impeachment e a inabilitação de Lula como candidato – haveria um refluxo do Estado de Exceção. Hoje em dia, apenas Fernando Henrique Cardoso sustenta essa falácia – sabendo que as pessoas acreditam que ele não acredita em uma vírgula do que fala.
Hoje em dia, qualquer pessoa contrária ao sistema está sob ameaça. Os exemplos são diários:
Busca e apreensão na casa de um advogado crítico da Lava Jato, porque foi flagrado em uma escuta telefônica, na qual seu cliente sugeria a ele não falar ao telefone.
Busca e apreensão na casa do ex-Ministro Delfim Neto, que está há mais de 30 anos fora do poder. Delfim vive de consultoria, mas o que recebeu por uma delas foi classificado como “propina”. O que ele tinha a oferecer, não tendo cargos? Dilma Roussef irritou-se com a intransigência das construtoras de Belo Monte e a falta de competição nas licitações. Delfim foi contratado pelas empreiteiras para montar um pool que garantisse a disputa. Uma delação que chamou o pagamento da consultoria de propina bastou para que invadissem sua casa e seu escritório. E houve quem celebrasse porque Delfim representaria a “ditadura” – aquela, que acabou com a eleição de Tancredo.
A persistência de invasões em universidades e outros centros de resistência.
A prisão de um ex-presidente da BRF por manipulação de teste sanitários. Liberou geral e não há força que consiga conter os abusos. As únicas declarações da presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Carmen Lúcia são de defesa genérica da corporação dos juízes.
A incapacidade do sistema legal de impedir as maiores negociatas da história, articuladas à luz do dia. Só atuam em episódios menores, à altura da compreensão do populacho: como a candidata a Ministra que faz selfie com fortões. Fogem dos temas centrais, como a venda da Eletrobrás, como o diabo da cruz.
Uma presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) completamente a reboque dos fatos, recebendo em casa – e servindo pão de queijo - um presidente prestes a ser indiciado. Como uma presidente débil como Carmen Lúcia, as tentativas de impedir abusos – como o das conduções coercitivas – resulta na operação BRF: várias prisões temporárias, arrostando claramente a proibição do Ministro Gilmar Mendes de conduções coercitivas. Depois de entregar ao Senado uma atribuição do STF – o julgamento de políticos acusados de corrupção – Carmen Lúcia agora se nega a antecipar a discussão sobre a prisão em 2ª instância unicamente devido ao fato de que poderia beneficiar Lula.
Ampliação da presença militar no governo.
Ilusão 2 – o fator Lula
Nos próximos dias, se desfará de vez a ilusão de que quem deu o golpe permitirá a candidatura de Lula. Enquanto a oposição pensa o P4R, a situação – que tem o jogo na mão – já planeja o cheque-pastor.
Não se limitará a impedir a candidatura de Lula, mas sua própria participação na campanha. Constatou o óbvio: que Lula é não apenas o candidato mais forte, mas também o eleitor mais influente. Por isso, há versões sustentando que haverá prisão – sim – e de prazo suficientemente prolongado para tirar Lula da campanha, vetando até seus depoimentos de apoio a candidatos.
Ilusão 3 – a vitória fácil sobre Temer
Há a ilusão de que o desastre Temer é suficientemente eloquente para inviabilizar candidaturas de direita – de Bolsonaro a Geraldo Alckmin. É possível, mas com um mínimo de articulação. Oposição não nasce das cinzas, como uma fênix.
O fator Lula – na condição de maior força da esquerda – até certo ponto minimizava as quizílias entre partidos de oposição. Quando se constatar a impossibilidade de Lula candidato, haverá choro e ranger de dentes – e tiros para todo lado, uma corrida para ver quem sai na pole position que, se não houver conversas e acordos prévios, poderá ser fratricida.
Será uma eleição dificílima, mesmo tendo do outro lado a sombra do mais execrável presidente da história.
No TSE (Tribunal Superior Eleitoral) haverá um general implacável, Luiz Fux, que já ameaçou com prisão prévia, busca e apreensão, os produtores de “fake News” – podendo interpretar, a seu talante, o que considera por tal. No pós-mensalão, assim que viu-se com poder, Fux afrontou o Congresso, no episódio dos royalties do petróleo, denotando uma vocação explícita para atos arbitrários. E no TSE, montado em uma legislação que deixa por sua conta definir o que é “fase News”?
Além disso, não se deve apostar tudo na fraqueza dos candidatos de direita. Luciano Huck sempre é uma possibilidade, principalmente se Geraldo Alckmin não alçar voo – e nada indica que voará. É possível que, à luz de pesquisas atuais, o sistema acabe convencendo Huck a beber do cálice da candidatura.
Em suma, para o segundo turno haverá um candidato que independe de mídia – Bolsonaro – e existe a possibilidade concreta de seu adversário ser alguém dito de centro-direita.
Conclusão – recompor o foco
À medida que vai se caminhando para um desfecho, e que cai a esperança de Lula candidato, se não houver uma ocupação rápida de espaço, as oposições serão presas fáceis de manipulações de toda ordem. Hoje em dia, qualquer intriga provoca incêndios violentos. O desespero induz a crenças em balas de prata e chás do Santo Daime.
O Brasil já provou definitivamente que a atual geração de homens públicos é a mais medíocre da história – talvez com algumas exceções na República Velha. Mas a esquerda terá que demonstrar que, pelo menos no seu quintal, há análise estratégica, bom senso e desprendimento.
Suas lideranças terão que, rapidamente, sentar e começar a negociar.
Talvez esta seja a grande contribuição de Lula, antes de consumado seu sacrifício.
*Artigo escrito e publicado por Luis Nassif, no site do GGN, em 12.03.18