Mauro Santayana*
E – diríamos nós – para piorar também a sua situação a longo prazo, impedindo que ela se recupere de forma mais rápida, contradizendo o discurso de que a Petrobras está "quebrada" e que essa crise se deve exclusivamente à corrupção e ao governo anterior.
O pior, segundo a FUP, é que o esmilinguamento proposital do valor dos ativos tem sido promovido justamente nas áreas que se está colocando à venda - as mais importantes e com maior potencial de lucro e de geração de caixa - como os campos de produção, as termelétricas, o Complexo Petroquímico de Suape, a Araucária Fertilizantes, o Comperj, que estão sendo vendidos a preço de banana, por 15,7 bilhões a menos do que teria sido possível arrecadar antes, além das distribuidoras de gás e de combustíveis.
Isso quer dizer que, somando-se a um tremendo prejuízo estratégico, com a entrega à concorrência de recursos naturais, tecnologia própria e mercado, que levaram anos para ser descobertos e desenvolvidos; se está praticamente doando, atabalhoadamente – e muitas vezes sem licitação, o que facilita e muito a possibilidade de ocorrência de corrupção, sem nenhuma razão que justifique a pressa, a não ser a vontade, não se sabe por que, de desmontar e entregar tudo o que for possível nos dois anos que restam ao atual governo – o patrimônio da nossa maior empresa a particulares e até mesmo a grupos estrangeiros, como a Statoil, que também são estatais, como a própria Petrobras.
A concessão de liminar, por uma juíza da Justiça Federal de Sergipe, suspendendo o processo de venda de participação da Petrobras nos campos de Baúna e Tartaruga Verde para a Karoon Gas Australia, nas bacias de Santos e de Campos, respectivamente, a pedido do Sindicato dos Petroleiros de Alagoas e Sergipe, com a justificativa de que a venda não poderia ocorrer sem licitação, mostra que ainda existe, no Judiciário, bom senso e responsabilidade suficientes para com a obediência a regras mínimas de alienação do patrimônio público, e, indiretamente, atenção ao irresponsável desmonte do Estado nacional em curso, e às suas deletérias, irreparáveis, consequências para o desenvolvimento brasileiro nos próximos anos.
O que os petroleiros deveriam fazer, em conjunto com outras instituições, como a AEPET, é barrar, na Justiça, toda e qualquer venda de ativos da Petrobras que estiver em andamento, que não tiver passado por ampla discussão e por competente e transparente processo de licitação, já que a empresa pertence a todos os brasileiros, incluídos os entreguistas e os imbecis que, nas redes sociais, assumem que a "odeiam" e que pretendem destruí-la, movidos pela desinformação, a manipulação e o preconceito que caracterizam a sórdida campanha realizada contra a Petróleo Brasileiro Sociedade Anônima ao longo dos últimos 4 anos.
Usando dados como os levantados pelo economista do Dieese Cloviomar Cararine Pereira, que mostram que a Petrobras não está quebrada, e que não precisaria vender esses ativos agora – justamente quando o petróleo está voltando a subir de preço – ou reduzir seu efetivo.
Não é possível que o fechamento e a venda de unidades como a Usina de Biodiesel de Quixadá, que acaba de deixar ao "deus-dará" milhares de agricultores e funcionários, se dê sem audiência pública, quando usinas como Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo, tiveram, no governo anterior, suas obras interrompidas por dezenas de vezes pela Justiça, por alegada preocupação com o meio ambiente ou a qualidade de vida da população local.
Do ponto de vista institucional, é importante também contestar, judicialmente, o relatório da Price Waterhouse and Coopers, para que essa empresa de "auditoria" – várias vezes multada e investigada pela justiça norte-americana, vide A Petrobras e o domínio do boato – explique e comprove, indubitavelmente, as perdas que, alega, foram sofridas pela Petrobras com corrupção, apontando em que operações se deu esse prejuízo; quem aprovou uma por uma; como se deu o desvio; para que contas foi supostamente repassado o dinheiro e quem recebeu os recursos teoricamente "desviados" de cada uma delas, no fantástico patamar informado, de 6 bilhões de reais.
Se fôssemos funcionários da Petrobras, e tivéssemos participado de alguma das numerosas comissões envolvidas, em diferentes níveis, na aprovação desses projetos; ou de aditivos envolvendo as obras que a Price Waterhouse tem por obrigação apontar, claramente, quais foram, nos sentiríamos pessoalmente atingidos em nossa honra e publicamente taxados de incompetentes, irresponsáveis ou corruptos.
E certamente, teríamos movido ações individuais contra a "auditora" – centenas delas, se necessário – para que fosse provado nosso envolvimento, ou definitivamente comprovada nossa lisura e inocência, abrindo a possibilidade para posteriores ações de indenização por danos morais.
Nem mesmo se o dono de uma empreiteira alegar que pagou, ou a quem pagou, "propinas" é possível confiar em sua palavra, devido às altíssimas condições de "temperatura" e de pressão e às ameaças de multas bilionárias, por exemplo, com que têm sido comumente negociados os acordos de "leniência" e obtidos os testemunhos e delações da Operação Lava Jato.
É preciso que provem cabalmente a quem deram o dinheiro e de que forma, e se houve realmente sobrepreço – comparando-se com preços de mercado e respeitando-se as especificidades de cada projeto – mesmo que expedientes estejam sendo utilizados corriqueiramente para transformar retroativamente alhos em bugalhos, como doações eleitorais legalmente registradas em "propina".
Os processos aos quais a Petrobras está sendo submetida nos EUA, partem, todos, da aceitação passiva da atual diretoria – e o pior, da diretoria anterior, que contratou, também sob extrema pressão, a Price – de que houve prejuízos e desvios no montante desses 6 bilhões de reais.
Cabe aos petroleiros demonstrar, por meio da Justiça, que não houve esses desvios ou que se eles eventualmente ocorreram foram infinitamente menores, não apenas para desmontar a farsa do "petrolão" – que justifica tudo que está sendo feito com a empresa e o país agora – mas também para que a Petrobras não tome ainda mais prejuízo com o pagamento de quase centenas de milhões de dólares em indenizações apenas nos processos que responde em Nova Iorque, movidos por grupos de especuladores que querem ganhar sempre, buscando, hipocritamente – mesmo que estejam arriscando seu dinheiro na bolsa – apenas o bônus sem ônus, em um novíssimo sistema econômico, o do "capitalismo sem risco".
* Mauro Santayana é cientista político. Artigo extraído do Portal Vermelho Portal.