Felipe Pinheiro*
Da sua criação até os dias de hoje, a Petrobrás sempre esteve no centro do debate político nacional. Símbolo da soberania nacional, nascida da mobilização popular, a maior empresa da América Latina sempre instigou o velho e polêmico debate sobre o papel do Estado na economia.
Na cabeça do povo, essa empresa já foi forte, pujante e boa para se trabalhar - orgulho nacional! Mas, o que vemos acontecendo nos últimos três anos é algo criminoso: a destruição de um sonho, de um protótipo de país que deu certo.
Desde 2014, com a chegada da Operação Lava Jato, a Petrobrás vem sofrendo um processo de completa destruição de sua imagem. Não bastassem as prisões, delações e coberturas midiáticas escandalosas sobre esquemas de corrupção, a direção da empresa vem desde aquele período produzindo seguidos balanços contábeis com déficits grotescos.
O dia de hoje fechou com mais uma porrada na nossa cara: R$ 16,5 bilhões de dólares de prejuízo no último trimestre. O peão que passará amanhã pela banca de jornais não hesitará em concluir: "VENDE ESSA PORRA!"
Na cabeça do peão, a conta é simples: O dinheiro público, fruto das contribuições baseadas no meu suor, vai todo para o bolso dos políticos corruptos. E nem pra ter gasolina barata essa empresa serve!
Impairment ou como fabricar um prejuízo
Com um prejuízo monstruoso desses, não há como não concluir que esta empresa realmente está em frangalhos. Contra fatos não há argumentos, certo?
Errado. A empresa tem obtido lucro real, mesmo que menor, em suas principais atividades, além de bater seguidos recordes de produção. Mesmo com a crise mundial no setor e com a redução do consumo de derivados no país, a empresa vem se saindo bem. O que tem ocasionado prejuízo em TODOS os balanços da empresa nos últimos três anos é o tal do impairment.
Essa ferramenta contábil, implantada por pressão do mercado após a explosão da Lava Jato, revê o valor dos bens/equipamentos da empresa de acordo com a previsão de retorno do mesmo.
[Imagina que você tem um carro e esse seu patrimônio varia seu valor conforme o mercado de automóveis usados - impairment significa atualizar o valor do seu carro. No caso da Petrobrás, alguns de seus bens perderam valor com a variação do dólar e do preço do barril do petróleo].
Nos últimos três anos, a Petrobrás vem rebaixando por seguidas vezes o valor de parte do seu patrimônio e lançando isso no seu balanço como um prejuízo contábil (de mentirinha). Neste último balanço, a desvalorização acarretou uma perda de cerca de R$ 15 bilhões - quase todo o suposto prejuízo do período.
A pergunta que fica é: Quando estes bens valorizarem de novo (exemplo: aumento do preço do petróleo), por acaso a Petrobrás vai lançar essa valorização como lucro?
Infelizmente, parece que não vai haver esse momento. A ideia é vender tudo quanto possível enquanto tá barato!
Vender patrimônio para pagar dívida: outra falácia!
O principal argumento para a venda (privatização) de parte da empresa é pagar sua dívida, supostamente "fruto da má gestão e da roubalheira do PT".
O crescimento da dívida tem lá seus motivos conjunturais, e não somente por perdas com corrupção nas últimas gestões. No entanto, vender patrimônio lucrativo e estratégico para a estatal e para o país não parece ser uma boa saída, a não ser para quem está comprando a preço de banana!
Exemplo disso é que, no último trimestre, uma pequena variação no dólar já acarretou em uma diminuição de 19% da dívida bruta da empresa - algo em torno de R$ 95 bilhões! Este valor representa mais de dez vezes a venda do campo de petróleo de Carcará, o primeiro a ser colocado no balcão de negócios de Pedro Parente.
Golpe atrás de golpe
Sem essa desconstrução simbólica, moral e econômica da imagem da Petrobrás, não seria possível o impeachment de Dilma. Da mesma forma, não seria possível privatizar a Petrobrás com toda essa tranquilidade.
Na verdade, não seria possível entregar o Pré-Sal para os estrangeiros com toda essa tranquilidade.
Agora, com a iminência de mais um ano de prejuízo (mesmo que fabricado) na estatal, o Governo Federal corre o risco de perder seu controle acionário majoritário da Petrobrás, conforme as regras do nosso glorioso mercado financeiro.
Você deve estar se perguntando: não me diga que você acha isso tudo foi arquitetado? Tire suas próprias conclusões.
* Felipe Pinheiro é petroleiro e diretor do Sindipetro-MG. Opinião extraída do Portal Sindipetro-MG no dia 14/11/16.